(Rodovia
Transamazônica - Estrada é uma das maiores do mundo: atravessa sete Estados
brasileiros e conecta duas regiões do país. Dos mais de 4,2 mil quilômetros de
extensão da Transamazônica, 1.753 são de terra. — Foto: Igor Mota / OLiberal)
O
Ministério Público do Pará (MPF) expediu uma recomendação para que o
Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) conclua licitação
e inicie, imediatamente, execução de plano básico ambiental para
reparar impactos gerados pela rodovia Transamazônica à Terra Indígena Sororó,
no sudeste do Pará.
Homologada
em 1983, a TI Sororó, do povo Aikewara, tem 26 mil hectares e abrange os
municípios de Brejo Grande do Araguaia, Marabá, São Domingos do Araguaia e São
Geraldo do Araguaia.
Em
visita realizada à aldeia em janeiro de 2024, o MPF constatou problemas
relacionados à segurança alimentar, saneamento básico e a escassez
de recursos hídricos, afetando a comunidade tradicional indígena, que são
relacionados à rodovia, segundo o MPF.
O
órgão ministerial fixou prazo de dez dias para que o Dnit inicie a
implementação das medidas emergenciais; e de cinco dias para apresentação de
cronograma completo dos trabalhos. O g1 solicitou posicionamento do
Dnit, mas ainda aguardava resposta até a publicação da reportagem.
Segundo
o MPF, a obra da BR-230 teve início na década de 70, antes da instituição da
Política Nacional de Meio Ambiente (Lei 6.938/81) e da exigência de
licenciamento ambiental para atividades ou empreendimentos potencialmente
nocivos ao meio ambiente e às populações tradicionais.
"Ou
seja, mesmo sendo uma das maiores rodovias do país, com mais de quatro mil
quilômetros de extensão que ligam o estado da Paraíba ao Amazonas, a construção
da Transamazônica ocorreu sem a adoção de medidas para redução ou compensação
dos impactos ao meio ambiente e aos ocupantes da área", afirma o órgão.
A
recomendação cita que, "da mesma forma, apesar de já estar condicionada ao
processo de licenciamento, a pavimentação da rodovia não observou as fases
exigidas pela legislação para o início das obras no trecho da Rota 1,
próxima às Terras Indígenas Nova Jacundá, Sororó e Mãe Maria".
Ainda
segundo o MPF, os impactos sobre os povos originários não foram medidos,
reparados ou mitigados. "Embora a pavimentação da rodovia tenha sido
concluída na década de 90, o processo ainda está na fase de licença de
instalação e a aprovação do Componente Indígena do Plano Básico Ambiental
(CI-PBA) ocorreu apenas em 2020", pontua.
As
apurações do MPF apontam que a pavimentação da Transamazônica afeta
especialmente a TI Sororó e que, entre as consequências apresentadas no Estudo
de Impacto Ambiental estão:
· aumento da insegurança na BR-153, que corta o território
do povo Aikewara;
·
aumento da pressão de caça por invasores;
·
extração ilegal de madeira;
·
insegurança alimentar;
·
alteração do calendário ecológico e da dinâmica
socioeconômica regional;
·
aumento de doenças;
·
abertura de novos travessões;
·
e uso da área para depósito de lixo.
Recomendação
A
recomendação do MPF destaca que, desde a finalização da pavimentação da
rodovia, há mais de vinte anos, comunidades indígenas têm buscado negociar com
o Dnit pequenas ações para obter a mínima reparação dos impactos decorrentes
das obras.
· "(...) o órgão atua perante os povos indígenas como
se o cumprimento dos programas de compensação se tratasse de mera
liberalidade”.
Já
o MPF enfatiza que o Dnit é responsável, perante o Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), pelo atendimento
às condicionantes estabelecidas na licença ambiental.
·
“Na qualidade de órgão executor, o Dnit assumiu ônus de
mitigar impactos às comunidades tradicionais e povos indígenas afetados direta
ou indiretamente pela obra”, afirma o procurador da República Rafael Martins.
·
Para ele, como qualquer ente público ou privado, cabe ao
Dnit “a imediata execução dos programas previstos no CI-PBA, não apenas
enquanto órgão responsável pelas vias federais, mas sobretudo como parte no
processo de licenciamento ambiental”.
Vistoria
Em
reunião realizada, em 2022, com lideranças indígenas, o Dnit informou que a
implementação do Componente Indígena do Plano Básico Ambiental estava em
estágio avançado, com previsão para a conclusão dos editais de licitação ainda
no primeiro semestre daquele ano – o que não ocorreu, de acordo com o MPF.
Em
dezembro de 2023, o órgão assumiu compromisso de implementar medidas
emergenciais, como a recuperação de vicinais, até a conclusão do processo de
licitação, e execução do CI-PBA, realizando ainda vistoria nas aldeias para
identificar demandas emergenciais.
O
relatório sobre a vistoria destacou demandas como limpeza das vias e adequação
do acesso às aldeias, desassoreamento de açude e instalação de bueiros.
Posteriormente,
o Dnit alegou que, por não estarem previstas no CI-PBA, as medidas emergenciais
estariam fora das atribuições do órgão e da possibilidade de implementação.
Impactos
O
MPF ressalta que, conforme o CI-PBA, o estabelecimento e execução dos programas
previstos no documento têm como objetivo promover, entre outros aspectos, a
segurança alimentar, o fortalecimento de atividades produtivas sustentáveis, o
estímulo à psicultura para consumo e comercialização, a melhoria do acesso aos
serviços de saúde, o fortalecimento da cultura Suruí Aikewara e a melhoria do
acesso aos serviços de educação.
Para
o órgão, a melhoria dos acessos às aldeias, por meio da manutenção das
vicinais, está relacionado diretamente com os programas estabelecidos,
principalmente, por impactar no escoamento da produção, viabilizar a conexão e
o fortalecimento da cultura entre as aldeias, e melhorar o acesso a serviços de
saúde no local.
Conforme
a lei do licenciamento ambiental, o CI-PBA deve ser elaborado e implementado
como parte do processo de licenciamento de empreendimentos ou atividades que
possam causar mudanças em terras indígenas.
O
objetivo seria mitigar impactos negativos e otimizar positivos, garantindo
integridade física e cultural de comunidades indígenas envolvidas e a
preservação de terras e recursos naturais.
G1/PA
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