quarta-feira, 3 de junho de 2009

PONTO VIVIDO, PONTO LIDO


PONTO VIVIDO E PONTO LIDO

A comunidade Divino Pai Eterno, Começou suas atividades em novembro do ano 1989. Na ocasião o bairro Setor Remor, quase não tinha casas. Poucas ruas eram transitáveis. Os poucos moradores, viviam em casas de tábuas, cobertas de folhas de Babaçu, uma palmeira, (que quase não existe mais na região). Havia apenas o clube de mães que tentava se organizar, além disso, um grupo de aproximadamente 4 pessoas se reunia esporadicamente, especialmente em dezembro, para a “Novena de Natal”. Eram voluntários que se reunia para rezar o “Terço”, mas não tinha uma meta específica, além disso, não recebiam assistência sistemática da equipe Paroquial, que também naquela época vivia em dificuldades por falta de pessoal.

A equipe paroquial, composta na ocasião, pelo padre Joaquim das Neves e duas religiosas, freiras da Congregação Filhas do Amor Divino, orientados pelo Bispo da Diocese de Conceição do Araguaia, Dom José Patrik. As dificuldades diocesanas não se restringiam á questão da falta de recurso financeiros e geográficos, mas, também política e ideológica, pois a ideologia do Regime Militar ainda estava presente na mente e no coração de muitos Brasileiros, não seria diferente dos habitantes que povoava a região Sul paraense, uma vez que Conceição do Araguaia acabava de sair da chamada Guerrilha do Araguaia.

A Diocese de Conceição do Araguaia vivia em constante conflito com os órgãos de Estado, de um lado, os ribeirinhos, posseiro e trabalhadores, do outro, fazendeiros, madeireiros e empresários financiados pela SUDAN, e pelo poder repressor, a maioria recém chegada á região. Foi permeada neste contexto que nasceu a Comissão Pastoral da Terra, entidade vinculada a (CNBB) Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil, criada com objetivo de apoiar os trabalhadores e suas organizações.

Rio Maria, vivia parte dos conflitos da Região que posteriormente passou a ser conhecida como “Araguaia Paraense” Onde a demanda por terra, madeira e ouro, contribuiu muito para a geração dos conflitos, muitas vezes divulgados pela imprensa Nacional e Internacional. Os trabalhadores viviam em uma luta desigual entre o trabalho e o capital, sem representatividade, agravou ainda mais a situação em que viviam especialmente, os da zuna rural. Isso foi também um dos motivos que conduziu o padre Ricardo Rezende Figueira, Mineiro de Juiz de Fora e Recém ordenado, eleito o primeiro coordenador da CPT na região, á Paróquia Nossa Senhora Aparecida de Rio Maria, onde, além do conflito agrário, as pastorais estavam centralizadas na Equipe Paroquial.

Figueira trazia com ele, além das metas definidas pela CPT, a idéia de reorganizar a paróquia (Paroquianos), dentro de uma metodologia em que juntava fé e política, isto é, fazendo uma leitura da realidade. Além disso, a idéia da descentralização das pastorais, abrindo maior espaço para a participação dos leigos nas atividades pastorais como resultado criou-se a pastoral da Criança, Pastoral da Saúde e Pastoral da Juventude. Partindo desta concepção surge a Comunidade Divino Pai Eterno

O Bairro Setor Remor, um dos cinco que havia na ocasião, Não havia Energia elétrica, as ruas eram escuras e não havia qualquer tipo de organização. Foi necessário um trabalho de base, num no primeiro momento de reconhecimento, segundo buscar colaboradores. Os recursos eram mínimo, tanto material quanto humano, contudo houve boa disponibilidade e muita receptividade, especialmente por parte de pessoas piedosas, a maioria delas ainda contribui. As reuniões, os encontros e as celebrações eram realizados de casa em casa, a maioria á luz de velas, a céu aberto, pois, boa parte das residências era pequena e com pouco conforto. Em poucos meses os frutos aparecia.

Agora, já se falava em “grupo da celebração”, este saía indo de casa em casa, de porta em porta, rua por rua. Encontrou muitas carências, mas também muita esperança. Além da celebração da Palavra e das orações, visitavam também doentes e discutia questões sociais de interesse coletivo e individual, como saúde publica educação, direitos humanos dentre outros. Quanto mais se conhecia o bairro e seus moradores, maiores eram as demandas, contudo aumentava o numero de participantes assim, o grupo cresceu e se fortaleceu disposto a enfrentar os desafios.

A partir de então se formou uma verdadeira corrente, seus elos se entrelaçando. Em cada encontro realizado pelo grupo um novo desafio se apresentava. Uma delas a de que o grupo precisava de um local adequado para suas reuniões, uma vez que nas celebrações já contava com a participação de aproximadamente 150 pessoas. Surge então a idéia da construção de uma capela onde poderiam disponibilizar de um mínimo de conforto e onde as pessoas poderiam manifestar sua fé e depositar suas esperanças. Vale lembrar que a participação masculina foi um diferencial na caminhada, uma vez que nas outras comunidades a participação de homens nas atividades da comunidade era mínima.
Ao contrário, no Setor Remor, iam toda a família, com um detalhe, os jovens e adolescentes faziam questão de participarem dos trabalhos, assim conquistando seu espaço junto ao grupo. Este espaço que foi sendo oferecido e favorecido a todos que ali recorriam. O que pode ser observado principalmente pelo envolvimento dos jovens, tanto nas atividades da Comunidade Divino Pai Eterno quanto nas atividades da Pastoral da Juventude, na qual contou com um grupo de 40 e até 50 jovens no bairro. Outra avaliação desse envolvimento foi à integração destes com as atividades sociais, (mutirões, campanhas de solidariedade) recreativas (piquenique, esporte) e pastorais (catequese, liturgia, pastoral do dízimo, entre outras. Outra avaliação que se faz é no que diz respeito às assembléias realizadas periodicamente na qual compareciam e participavam a média de 120 pessoas, onde todos discutiam assuntos de interesse de todos, sentindo se iguais, respeitando a limitação de cada um. O que pode se observado em consulta aos registros da participação no conselho Comunitário onde a média de participação gira em torno de 23 pessoas, sendo 60% mulheres e jovens. O conselho Comunitário, também é outra fonte seta constatação. O formado por representantes dos (8) nove pequenos grupos -Circulo Bíblico, Oração, Catequese, Grupo de Jovens, Pastoral do Dízimo, Crismando, Grupo da Liturgia, pastoral do Batismo e Grupo do Mutirão, este último, formado por pessoas com experiência em serviços de construção civil, (Nesta época ainda não havia no bairro a pastoral da criança) - coordenado por uma comissão composta 5 pessoas (Coordenador, Primeiro e segundo Secretario, primeiro e segundo Tesoureiro), ali, discutiam as demandas apresentadas, deliberavam e decidiam os encaminhamentos das atividades especificas. As Assembléia se realizavam geralmente acompanhando o calendário Paroquial e Diocesano, ou seja, uma entre janeiro e fevereiro, outra entre julho e agosto e uma terceira próximo ao final de cada ano, com exceção da coordenação que se reunia geralmente mensalmente, ou quando se fizesse necessário.

Assim, no final do ano 1991 o grupo iniciou a construção da Capela. A primeira Igrejinha foi construída em um terreno de 450 m2 (quatrocentos e cinqüenta metros quadrados), localizado na av. 14, cedido pela Paróquia, que imediatamente passou a ser denominada de Capela do Divino Pai Eterno. Em 1992, o grupo adquiriu com recursos próprios um outro terreno, este ao lado, de frente para a trv. 6, onde foi edificado um barracão destinado ás atividades sociais em 1995. Dois anos depois, (1997), como o numero de devotos crescia, o Conselho Comunitário resolveu aumentar também a capela, pois a antiga já não comportava os mais de 300 participantes, numero acrescido especialmente nos momentos festivos. Além disso, construiu uma sala em anexo para desenvolver atividades pastorais dentre elas, aulas de catequese, preparação do crisma e de outros sacramentos, ali funcionou também uma escolinha vinculada a Escola Estadual Senador Catette Pinheiros onde duas professoras cedidas pela Prefeitura ministravam aulas para duas turmas de crianças com idade 5 e 6 anos. Já ano de 1998 o Conselho resolveu construir também mais dois pequenos anexos, sendo um com três pequenas salas, onde uma delas serviu para abrigar o estúdio da Radio Comunitária Berokan Fm e, outras duas salas, sendo para o grupo de jovens, outra para a secretaria da Comunidade. Além disso, construiu outro barracão, destinado ao funcionamento de uma cozinha, bar e sala de deposito. Registra-se também que, a Comunidade Divino Pai Eterno foi a primeira Comunidade Eclesial de Base (CEBs) da Diocese de Conceição do Araguaia a ter um conselho Comunitário, (descentralização). Foi ainda, a primeira Comunidade Eclesial de Base em Rio Maria a ter o Sacrário (local considerado sagrado), onde se guarda ás hóstias usadas na liturgia e na comunhão dos fiéis. Além disso, foi uma das primeiras CEBs da Paróquia de Rio Maria a possuir retro-projetor, instrumentos musical próprio, bem como caixa acústica. A Comunidade Divino Pai Eterno, foi a primeira comunidade religiosa de Rio Maria a criar e utilizar o convite personalizado para angariar recursos, bem como, atrair fiéis para a festa do seu padroeiro. Lembrando que a Comunidade Divino Pai Eteno, não conta subvenções, ou com recursos financeiros de outras fontes, exceto dos fies devotos.

O tempo passou.
O conselho Comunitário é quase inexistente. Os pequenos grupos de trabalhos se dissolveram, talvez não suportando ás mudanças advindas das novas orientações. As celebrações não conta mais com o entusiasmo de antes. Não existe mais trabalho social empreendido pela comunidade. Atualmente o grupo de jovens concentra-se em um pequeno grupo de adolescentes, que apesar de ser também importante, não discutes a realidade própria dos jovens como o anterior. As procissões não têm a mesma participação. Entretanto, a festa do padroeiro, (Divino Pai Eterno), continua atraindo inúmeros devotos, inclusive vindo das colônias e das cidades vizinhas. Avalia-se compareçam em média de cinco a seis mil pessoas em cada festejo, especialmente nos dois últimos dias em que o público chegue a três mil em uma única noite. Este ano, em que se celebra a décima sexta festa, verifica-se a presença marcante do Pentecostalismo em lugar da CEBs. Avalia-se ainda que, as mudanças estão sendo cada vez mais profundas, pois, tanto a paróquia quanto os condutores das atividades da Comunidade não estão conseguindo conciliar a tradição e a cultura dos devotos do Divino Pai Eterno e o moderno. Atualmente, o numero de integrantes do conselho comunitário, aproximadamente cinco pessoas, demonstra que pode estar havendo o retorno á centralização. As mudanças podem ser observadas ainda, pela ausência das assembléias e pelo reduzido numero de pessoas na equipe de Preparação do Batismo, na qual, não se utiliza mais as palestras anteriormente feita por pessoas, mas sim, através de vídeos e outros recursos audiovisuais. Avalia-se também, outro ponto que pode influenciar no esvaziamento da Comunidade é o retorno á centralização. São a retirada ou substituição de símbolos tradicionais, tais como, imagens, bandeira, cântico e até mesmo na metodologia utilizada nas orações. Isso pode estar gerando descontentamentos aos antigos devotos.

A utilização de recursos tecnológicos é reconhecidamente importante, especialmente quando utilizado de forma adequada e para melhorar as condições de trabalho e as condições de vida das pessoas, porém, não se deve deixar que as inovações tecnológicas substituam a pessoa humana, bem como a centralização de poder, principalmente nas instituições populares, sociais e religiosas com secular histórico de luta na promoção dos direitos humanos, individuais e coletivos, como é o caso das Comunidades Eclesial de Base, com papel fundamental e importante no embate a ditadura.

Contudo, persiste a pergunta:
O que atraí tantas pessoas á esta festa que está se tornando tradicional no calendário de eventos, tanto em nível de paróquia quanto municipal e regional?
Terá sido devoção ao Santo Divino Pai Eterno? (muito celebrado e festejado na Cidade de Trindade, Estado de Goiás).
Terá sido a forma descentralizada de trabalho inicialmente planejada?
Se não foi está, Qual terá sido mesmo a metodologia utilizada pelos seus idealizadores?

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